A Escotilha do Chieftain: Força Imperial Australiana

Esta ano marcou o centenário da partida da Força Imperial Australiana (AIF) para participar na Grande Guerra, e vários eventos tiveram lugar por toda a Austrália para comemorar isso. Esta semana, entrego o teclado ao The Warhawk para uma visão geral da entrada da Austrália nos assuntos militares mundiais, como uma importante entidade independente.

O Governo Australiano anunciou sua intenção de prestar apoio à Grã Bretanha contra a Alemanha a 5 de agosto de 1914, um dia depois da declaração de guerra britânica. Contudo, o Governo Australiano percebeu que estavam pouco equipados para assistir o resto do Império Britânico na guerra que se iria desenrolar. O Exército Australiano tinha sido fundado em 1901 e, como tal, só existia há uns escassos 13 anos. Além disso, tinha sido dividido em dois grupos distintos: A Força Militar Cidadã e a Força Permanente. A primeira era uma Milícia de Cidadãos e a segundo um pequeno grupo geral de oficiais profissionais. Um ano antes da abertura das hostilidades, o Exército tinha pouco mais de 2 000 soldados profissionais. Tornando a situação ainda mais complicada estava o fato de o Ato de Defesa de 1903 impedir que os soldados do país fossem enviados para o exterior.

O Exército Australiano precisava de uma força expedicionária que fosse capaz de partir para a Europa, para confrontar o Exército Alemão. Isso iria se tornar a Força Imperial Australiana (AIF). A AIF nasceu a 14 de agosto de 1914, e sua formação viria a se tornar um importante marco na História do Exército Australiano. A AIF viria, em última análise, a ser a primeira Formação Militar Australiana capaz de levar a cabo uma campanha militar de longa duração no exterior.

Esta foi, de várias formas, uma idéia original do General William Bridges. Bridges já tinha uma carreira militar bastante produtiva antes do início da guerra. Ele tinha frequentado o Colégio Militar Real do Canadá (embora não tenha conseguido se graduar) mas juntou-se ao Exército Britânico e ocupou uma série de posições na Escola de Artilharia. Em 1899, viria a servir na Guerra dos Bôeres e, dez anos mais tarde, a ser nomeado Chefe do Estado-Maior do Exército Australiano. Ele foi também o primeiro comandante do Colégio Militar Real de Duntroon.

General William Bridges, 1º Comandante da AIF

A primeira proposta do Brigadeiro General Bridges para uma Força Expedicionária Australiana era no sentido de ter uma força de 18 000 homens, com 6 000 vindo da Nova Zelândia. Contudo, isto mudou a mando do Primeiro Ministro Joseph Cook, passando a uma única divisão de Infantaria, consistindo de três brigadas e de uma Brigada de Cavalaria Ligeira, para prestar suporte. Esta 1ª Divisão de Infantaria Australiana viria a juntar-se com uma segunda divisão, composta por duas brigadas, uma delas proveniente da Nova Zelândia. A segunda Divisão foi nomeada Divisão Australiana e da Nova Zelândia. Estas duas divisões viriam a compor a espinha dorsal da nova Força Expedicionária Australiana. O nome Força Imperial Australiana acabou por ser escolhido por William Bridges, a quem foi atribuída a posição de Oficial de Comando. Com novo Comando, recebeu a promoção a Major-General, o que o tornou o primeiro Major-General na história do Exército Australiano.

Apesar da população relativamente escassa da Austrália na altura (somente cerca de 4,9 milhões), a AIF não tinha falta de Voluntários. Em dezembro de 1914, a AIF tinha recebido perto de 53 000 voluntários de toda a Nação. De fato, todos os membros das Forças Armadas Australianas que entraram em serviço na Grande Guerra eram voluntários. O primeiro comboio naval de 38 elementos transportando Soldados da AIF partiu de Albany, Austrália Ocidental, a 1 de novembro de 1914.

Força Expedicionária Militar e Naval Australiana (AN & MEF)

A força militar australiana que entrou inicialmente em combate não foi a AIF mas sim a Força Expedicionária Militar e Naval Australiana. Esta unidade exisitiu por pouco tempo, em 1914, altura em que esteve em ação contra os alemães nas Colônias do Pacífico, Nova Guiné e o Arquipélago de Bismarck. Na altura, a Grã Bretanha temia que o Esquadrão da Ásia Oriental Alemão viesse a conduzir um corso contra os navios mercantes britânicos no Pacífico. Assim, o Governo Britânico pediu que o Exército Australiano destruísse as estações de rádio e de carvão alemãs. Isso tinha de acontecer dentro de seis meses.

Soldados da AN & MEF na Austrália, antes do seu destacamento

A AN & MEF foi fundada com esta tarefa em mente, e os australianos não tiveram problemas em encontrar voluntários. Eles reuniram mil soldados e quinhentos marinheiros. A Infantaria surgiu quando o 1º Batalhão AN & MEF foi composto a partir de voluntários em Sydney. Entretanto, a Componente Naval foi formada em torno de quase toda a Marinha Australiana, incluindo o cruzador de batalha HMAS Austrália, os cruzadores HMAS Sydney, Melbourne, e Encounter e o Contratorpedeiro Werrago. O submarino AE1 também participou brevemente na campanha; contudo, ele desapareceu mais tarde, junto com sua tripulação.

Na madrugada de 11 de setembro de 1914, a AN & MEF chegou à costa de Rabaul. Este viria a ser o primeiro confronto envolvendo australianos. Os australianos que desembarcaram perceberam que a área não estava sendo defendida com grandes recursos.  Depois de uma pequena mas feroz batalha pela estação de rádio em Bita Paka, e de um breve cerco a Toma, o Governo Alemão em Rabaul rendeu-se a 17 de setembro de 1914, com o grupo final de soldados alemães se rendendo a 21 de setembro. A Nova Guiné e Rabaul viriam a permanecer ocupadas pelos australianos durante o resto da guerra, e seriam depois oderecidas à Austrália na sequência do Armistício, em 1918.

Afundamento do SMS Emden

HMAS Sydney

O HMAS Sydney era um dos navios de escolta atribuídos ao primeiro Comboio Naval da AIF, com seu irmão Melbourne, o cruzador britânico Minotaur, e o cruzador japonês Ibuki. O Sydney era um cruzador leve de Classe Town, construído para os australianos havia apenas dois anos. Seu Oficial de Comando, Capitão John Collings Taswell Glossop, viria a comandá-lo durante a primeira batalha naval disputada pela Marinha Real Australiana. A 9 de novembro, o comboio naval recebem um contacto de uma estação de rádio britânica nas Ilhas Cocos, a cerca de 50 milhas do Comboio. A Estação interceptou um código desconhecido, e contactou os escoltas do Comboio Naval para pedir ajuda na identificação do código. Cocos seguiu a mensagem com um relatório de identificação que descrevia um navio de guerra desconhecido se aproximando, e finalmente um SOS.

O navio de guerra desconhecido era um cruzador leve de Classe Dreseden, o SMS Emden. O Emden e seu capitão, Karl von Muller, tinham sido uma pedra no sapato do Entente desde a abertura das hostilidades. A embarcação lançou um raid altamente eficiente em Penang para afundar um contratorpedeiro francês e um cruzador blindado russo. O Emden tinha desembarcado alguns homens em Direction Island para demolir a estação de rádio britânica.

Um Cruzador de Classe Dreseden semelhante ao SMS Emden

Após receber o pedido de socorro, o Sydney foi enviado para investigar o assunto. Às 0905, ele avistou o Emden e preparou-se para engajar. A embarcação alemã disparou as primeiras duas salvas da batalha. A salva inicial não chegou a atingir Sydney. O mesmo não se pode dizer da segunda. Sydney aguentou fogo pesado de Emden, enquanto procurava alcance para abrir fogo também. Durante este período, Sydney aguentou 15 acertos que mataram quatro marinheiros e feriram outros dezasseis. Estes viriam a ser as únicas perdas da embarcação durante a batalha.

Com a distância encurtada, o Sydney abriu fogo. Apesar de ser forçado a engajar a um menor alcance, o Sydney tinha mais poder de fogo do que o Emden. Quando a embarcação australiana disparou, o Emden foi devastado. Depois de repetidas salvas do Sydney, o cruzador alemão tinha perdido seus mastros, bem como sua estação de controle de fogo. Depois de suster ataques no seu leme e sala do motor, Von Muller decidiu encalhar o SMS Emden ao longo da costa da Ilha Keeling do Norte. Vendo que o Emden tinha sido encalhado, o HMAS Sydney quebrou o engajamento para perseguir o navio de carvão Buresk, que vinha reabastecendo o Emden. Na altura em que o Sydney interceptou o Buresk, ele já estava no processo de ser afundado por sua tripulação. Uma equipe de abordagem australiana capturou os alemães e o Sydney desempenhou o coup de grace final, antes de voltar à posição do Emden.

Destruição do SMS Emden depois do duelo com o Sydney

Na altura da chegada do Sydney ao Emden, o cruzador alemão ainda estava exibindo suas cores. O HMAS Sydney sinalizou duas vezes, com a bandeira, pedindo ao Emden para se render. Quando a embarcação alemã não devolveu o sinal, os australianos abriram fogo. Com o navio destruído, o Capitao von Muller ordenou que a bandeira do Emden fosse baixada e que um marinheiro colocasse uma bandeira branca. Procurando evitar que a bandeira do seu navio fosse levada como um prêmio, eles destruíram a Insígnia Imperial.

A Batalha de Cocos chegava, assim, ao fim. Os alemães tinham perdido duas embarcações e cerca de 134 marinheiros. Outros 39 foram feridos, e foi capturada uma mão cheia de alemães. A equipe de desembarque, enviada para destruir a estação de rádio na Ilha Direction, conseguiu capturar uma pequena embarcação e navegar para o Império Otomano. A batalha foi uma conquista significativa para a Marinha Real Australiana. Foi o primeiro confronto à superfície disputado pela Marinha Australiana na sua história. Como parte de um panorama estratégico mais vasto, a vitória em Cocos destruiu o único navio corsário alemão na região do Oceano Pacífico e Índico. O que restou do Esquadrão Alemão da Ásia Oriental viria a ser destruído na costa de Falklands no mês seguinte, durante uma tentativa de alcançar a Alemanha.

Os Australianos no Egito e Além

O Comboio Naval da AIF desviou-se de seu destino original, a Grã Bretanha, para o Egito. Havia falta de estruturas para receber os australianos na Grã Bretanha. Os soldados australianos e da Nova Zelândia chegariam a Alexandria a 3 de dezembro de 1914. A AIF acabaria por não atuar mais em 1914. Os soldados da AIF viriam a passar o resto do ano treinando no Egito. Em janeiro e fevereiro do ano seguinte, a Divisão da Austrália e Nova Zelândia viria a servir contra os Otomanos, durante seu saque no Canal do Suez. Contudo, a maior parte do Serviço Imperial Australiano não entraria em combate até 25 de abril de 1915, em Galípoli.

11º Batalhão Australiano na Pirâmide de Quéops, em Giza, Egito

A Força Imperial Australiana entraria em serviço em todos os teatros da guerra. Os australianos podiam ser encontrados nas selvas da Nova Guiné, nos desertos do Médio Oriente e nas trincheiras da Frente Ocidental. Os “Diggers” australianos serviram com distinção, e 66 viriam a receber a Cruz Vitória pelo seu valor em combate. Até ao final das hostilidades, em 1918, 331 781 serviram no exterior. Deste número, registaram-se mais de 210 000 vítimas, 65% de toda a AIF, o valor mais alto de qualquer nação beligerante na Primeira Grande Guerra. Desse número, 61 519 australianos fizeram o sacrifício máximo, perdendo a vida.

Numa escala superior, o serviço da Força Imperial Australiana na Primeira Grande Guerra foi visto como um momento de viragem na história da Austrália e Nova Zelândia. É visto, até aos dias de hoje, como um momento determinante na formação de uma identidade nacional para os cidadãos de ambas as nações. Ambas as nações era relativamente novas. A Commonwealth da Austrália só foi estabelecida em 1901, e o Domínio da Nova Zelândia em 1907. O centenário da fundação da AIF marca o momento em que ambas as nações se ergueram e desempenharam papéis de grande importância pela primeira vez, em cenário internacional.


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